
Formas de ação do Estado no contexto atual – as regulações e ações negativas
Há fortes tendências concentracionistas e há grandes possibilidades de democratização da produção, que se traduzirão em diversidade cultural e democratização econômica. Dependendo de como as políticas públicas atuarem, o setor digital seguirá caminhos diversos.
A grosso modo o Estado pode regular através de ações que eu chamarei de afirmativas e negativas. Ambas são importantes e devem ser usadas em paralelo. As ações negativas são fiscalizatórias e punitivas visando impedir os agentes de tomarem determinadas atitudes. Já as ações afirmativas não impedem nada, elas apenas incentivam os agentes a seguirem determinados caminhos.
Na área de conteúdos digitais o Brasil hoje não atua em nenhum dos sentidos. Uma das propostas mais importantes do recente ante-projeto da Ancinav é suprir essa carência, pois a Agencia terá abrangência para atuar em toda a área de conteúdos, em qualquer dos meios digitais e analógicos.
Há vários exemplos de “ação negativa” necessárias hoje para regular o mundo digital. O artigo 222, por exemplo, que limita a propriedade estrangeira nos meios de comunicação se aplica à radiodifusão, mas não se aplica as empresas de Telecomunicações, que estão dispostas a entrar na produção de conteúdo audiovisual e podem se tornar verdadeiras redes de televisão, com capital totalmente internacionalizado, o que pode ferir os princípios de nossa constituição.
O artigo 222 poderia ser estendido a todas as empresas que pretendem produzir conteúdo. Numa primeira leitura poderíamos estender ao mundo digital alguns princípios de regulações que já se aplicam (ou esperamos que se apliquem) ao mundo da comunicação analógica. Por exemplo:
a) exigir as empresas a terem certa quantidade de produção educativa;
b) regular horários para determinados conteúdos;
c) impedir propriedade cruzada de diferentes meios de comunicação;
d) impedir a concentração excessiva da audiência,
e) garantir cota de conteúdos nacionais, etc….
No entanto, alguns princípios do mundo analógico não se aplicam ao mundo digital. A questão ainda deve ser aprofundada e discutida, mas coloco-a como forma de questionamento: faz sentido estabelecer como princípio a necessidade de não ter concentração vertical, ou seja, de uma mesma empresa ser produtora e difusora?
Isso se aplica muito bem a televisão atual (aliás, infelizmente, não se aplica, mas deveria se aplicar), para o mundo da transmissão analógica que, por ter uma banda limitada, exige que o poder público administre as concessões. Mas faria sentido no mercado da Internet, onde todos podem ser seus próprios difusores? Faz sentido num mundo onde um pequeno produtor pode difundir sua programação? É claro que não.
E por mais que eu sonhe em reduzir o poder das grandes empresas de mídia eu não vejo mais tanto sentido em impedir uma empresa de atuar em vários setores (jornal, mídia, Internet, etc..). A própria FCC (órgão de regulação americano) acabou com essa limitação, com o argumento que estava impedindo a vantagem competitiva das empresas americanas.
É estranho admitir, mas eles podem ter razão. Como eu disse antes no digital “bits são bits” e seria um anacronismo impedir uma empresa como a Rede Globo tenha lucros com seus conteúdos no mercado de Internet. Além disso, não é apenas as empresas grandes que atuam assim. Pequenos produtores de conteúdos independentes fazem simultaneamente filmes, site e livros.
O que fica claro é que ao falar de Internet e do mundo digital não se aplica muitos dos princípios de regulação do mundo analógico. Como poderíamos exigir cotas de produção nacional ou regional num mundo onde o processo é permanente e é difícil definir o conteúdo.